A ascensão da inteligência artificial levanta um debate instigante: ao delegarmos tarefas cognitivas a máquinas, estamos nos tornando mais produtivos ou mais dependentes? A preocupação de que a IA possa nos "deixar burros" tem ecoado entre pais, educadores e especialistas, mas a realidade pode ser bem diferente.
Desde a revolução digital, algumas habilidades se tornaram obsoletas. Quem ainda domina o uso de uma máquina de escrever com a destreza de décadas passadas? Perder habilidades não é sinônimo de retrocesso, mas sim um reflexo da evolução. A alfabetização digital substituiu práticas manuais e, agora, a alfabetização em IA promete redefinir a maneira como trabalhamos e aprendemos. Resistir a essa mudança é ignorar um novo cenário onde a inteligência humana e artificial coexistem.
No ambiente de trabalho, quem entende e domina ferramentas de IA mantém sua relevância profissional e se torna mais eficiente. O medo da substituição por máquinas precisa dar lugar à adaptação. Se os computadores aposentaram o corretivo líquido e ninguém sentiu falta, por que deveríamos lamentar a automação de tarefas repetitivas e mecânicas?
Há uma linha tênue entre a otimização da inteligência e a dependência dela. Se antes precisávamos consultar livros para obter informações, hoje buscamos respostas instantâneas, muitas vezes sem questioná-las. A IA não pensa, apenas processa padrões. A grande questão é: estamos desenvolvendo pensamento crítico na mesma velocidade em que incorporamos essas novas ferramentas?
A inteligência artificial não roubará nossa inteligência, mas pode nos tornar intelectualmente complacentes se não soubermos usá-la com discernimento. Em vez de temer a IA, devemos explorá-la, compreendê-la e garantir que ela amplie nossas capacidades em vez de limitá-las. Afinal, terceirizar a inteligência não é o problema – o verdadeiro risco é terceirizar o pensamento.
Sobre a autora:
Flávia Fernandes é jornalista formada pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), professora de língua inglesa e especialista em inteligência artificial pela PUC Minas e Faculdade Exame. Apaixonada por comunicação e inovação, investiga as conexões entre tecnologia, sociedade e o cotidiano.