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Trabalho escravo pode levar a perda da terra ou propriedade, prevê projeto

Tramitação está acelerada

16/04/2023 às 16h15 Atualizada em 16/04/2023 às 16h33
Por: Redação
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Projeto está sendo avaliado pelos congressistas, mas ainda é considerado polêmico.
Projeto está sendo avaliado pelos congressistas, mas ainda é considerado polêmico.

Donos de terras ou imóveis utilizados para emprego de mão de obra escrava poderão perder a posse do bem em ação judicial movida pelo Estado.

Na verdade, a  expropriação de imóveis urbanos ou rurais em que for constatada a exploração de trabalho em condições análogas às de escravidão está prevista no artigo 243 da Constituição Federal.

Porém,  não há uma lei que regulamente esse processo, impedindo  a aplicação desse tipo de punição aos criminosos.

Quatro anos após ser apresentado, um projeto de lei que cria as regras para a expropriação finalmente avançou no Congresso na última semana, com a aprovação unânime na Comissão de Direitos Humanos do Senado.

O PL 5.970/2019, de autoria do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), define que são passíveis de expropriação propriedades urbanas e rurais onde for explorada mão de obra análoga à escrava somente após o trânsito em julgado de sentença – ou seja, quando não couber mais recurso – no âmbito penal ou trabalhista. Com a expropriação, o proprietário perderá o bem sem direito a qualquer indenização por parte do Estado, diferentemente do que ocorre nos casos de desapropriação, em que há uma compensação financeira pela tomada do objeto de valor.

Regulamentação

“Estamos falando de um crime cometido muitas vezes com violência, contra crianças, jovens, mulheres, adultos e idosos. A regulamentação do artigo 243 contribui significativamente para fazermos o enfrentamento desse tipo de crime”, disse ao Congresso em Foco o presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), Bob Machado.

O artigo 243 da Constituição também prevê a expropriação de propriedades nas quais se localizem culturas ilegais de plantas psicotrópicas. O assunto, no entanto, foi regulamentado com a aprovação de uma lei em 1991. Regulamentação essa que falta no caso do trabalho escravo, também previsto no mesmo dispositivo constitucional.

“Esperamos que o Congresso se sensibilize. Essa não é uma pauta ideológica. Não estamos falando de empregadores, de pessoas que cumprem a lei, gerando emprego, movimentando a economia. Estamos falando de criminosos. Pessoas que cometeram crimes bárbaros e precisam ser punidas”, defende o presidente do Sinait.

Características do trabalho escravo

O projeto aprovado pela Comissão de Direitos Humanos, com a relatoria de Fabiano Contarato (PT-ES), também estabelece que qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência da exploração de trabalho em condições análogas às de escravo será confiscado e se reverterá ao Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).

O texto caracteriza como trabalho em condições análogas às de escravo:

 a submissão a trabalho forçado, exigido sob ameaça de punição, com uso de coação ou com restrição da liberdade pessoal; a adoção de medidas para reter a pessoa no local de trabalho (como o isolamento geográfico ou o cerceamento do uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador), inclusive em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto; a manutenção de vigilância ostensiva no local de trabalho ou a apropriação de documentos ou objetos pessoais do trabalhado; a atividade que ocorre sob condições degradantes, consistentes com violações aos direitos fundamentais do trabalhador que impliquem privação e negação do reconhecimento de sua dignidade; a sujeição a uma jornada exaustiva, entendida como aquela que, por sua intensidade ou extrapolação não eventual com prejuízo ao descanso e convívio social e familiar, cause sobrecargas físicas e mentais incompatíveis com a capacidade psicofisiológica do trabalhador, expondo-o a elevado risco para a saúde ou de ocorrência de acidente do trabalho.

Critérios para desapropriação

De acordo com o projeto, que será analisado agora pela Comissão de Assuntos Sociais (CAS), a expropriação prevalece sobre direitos reais de garantia. O proprietário não poderá alegar falta de ciência sobre a ocorrência da exploração desse tipo de trabalho em seus domínios; e as propriedades expropriadas eventualmente não passíveis de destinação à reforma agrária e a programas de habitação popular deverão ser alienadas, sendo os valores decorrentes revertidos ao FAT.

O texto exclui da expropriação o imóvel rural e urbano alugado ou arrendado pelo proprietário, desde que não tenha tomado conhecimento e se omitido em relação às condutas que caracterizam a exploração de trabalho análogo ao de escravo em sua propriedade, e não tenha auferido benefício econômico, direto ou indireto, em razão de negócio jurídico, exceto o proveniente de eventual remuneração pela cessão da posse do imóvel.

Estabelece, ainda, que ficam sujeitos à expropriação os imóveis rurais e urbanos possuídos a qualquer título, ainda que seu titular não detenha o respectivo título de propriedade.

O projeto define que a ação expropriatória será processada e julgada no âmbito da Justiça Federal, excluído o segredo de Justiça.

 

Só na Justiça 

Conforme emenda acertada entre Contarato e a senadora Soraya Thronicke (União-MS), “a expropriação somente poderá ocorrer pela via judicial, em ação específica de natureza penal ou trabalhista, e fica condicionada ao prévio trânsito em julgado de sentença condenatória por exploração de trabalho em condições análogas à de escravo”.

A proposta altera a Lei 7.998, de 1990, que regula o Programa do Seguro-Desemprego, o Abono Salarial, e institui o FAT, para incluir entre as finalidades do Seguro-Desemprego a oferta de condições dignas de retorno ao trabalhador que foi deslocado ou se deslocou de seu local de residência e depois foi submetido a trabalho escravo, estabelecendo que cabe ação regressiva da União contra o seu explorador.

Também impõe multa ao infrator (equivalente a três vezes o maior valor vigente da parcela de seguro-desemprego, multiplicada pelo número de trabalhadores identificados na situação de exploração) e inclui entre as receitas do FAT todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência da exploração de trabalho em condições análogas à de escravo, além de recursos provenientes da alienação da propriedade expropriada nessas condições, não passível de destinação à reforma agrária e a programa de habitação popular.

Define, ainda, que tais recursos serão destinados ao amparo do trabalhador resgatado, inclusive por meio da oferta de formação profissional e tecnológica e da inserção no mercado de trabalho, “considerando sua necessidade peculiar de readaptação”. Desde a criação dos grupos especiais de fiscalização móvel, base do sistema de combate à escravidão no país, em maio de 1995, mais de 60 mil trabalhadores foram resgatados e R$ 127 milhões pagos a eles em valores devidos. (Com informações da Agência Senado)

O que diz o artigo 243 da Constituição Federal, alvo de regulamentação do projeto:

“Art. 243. As propriedades rurais e urbanas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo na forma da lei serão expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei, observado, no que couber, o disposto no art. 5º. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 81, de 2014)

Parágrafo único. Todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e da exploração de trabalho escravo será confiscado e reverterá a fundo especial com destinação específica, na forma da lei. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 81, de 2014).”

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