Nove deputados da comissão que discute projetos de lei ligados à saúde e à alimentação encheram os bolsos com dinheiro do agronegócio nas últimas eleições.
O resultado? Está cada vez mais difícil aprovar projetos de lei que contrariem os interesses do agro.
Ao menos 22 empresários do agronegócio desembolsaram, juntos, R$ 2,1 milhões para financiar as campanhas de nove parlamentares que agora são membros da Comissão de Saúde na Câmara dos Deputados.
O levantamento feito pelo Intercept considerou apenas as doações a partir de R$ 50 mil. A quantia e o número de membros favorecidos, portanto, pode ser ainda maior.
Recriada este ano a partir da separação da Comissão de Seguridade Social e Família, a Comissão de Saúde é responsável por analisar projetos de lei e outras propostas legislativas relacionadas ao tema.
Os principais financiadores dos parlamentares que discutem assuntos como alimentação e nutrição, SUS e patentes lucram com venda de açúcar, batata frita, ultraprocessados e até cachaça.
Não por acaso, propostas como a maior tributação desses alimentos ou a regulamentação de publicidade do setor têm encontrado resistência para serem aprovadas.
Quem mais deu dinheiro para a campanha de titulares da comissão foi o empresário Robert Carlos Lyra, que atua no ramo sucroalcooleiro em Minas Gerais.
Foram R$ 400 mil, divididos igualmente entre o atual presidente da comissão, Zé Vitor, do PL, e o deputado Pinheirinho, do PP.
Em 2009, quando ainda era sócio da Usina Caeté, em Alagoas, Lyra foi denunciado pelo Ministério Público Federal, o MPF. A investigação apontou que a empresa teria cometido 16 crimes ambientais desde 2001 e foi autuada seis vezes pelo Ibama entre 2005 e 2007, mas nunca obedeceu às ordens para interromper o desmatamento e recuperar a área degradada.
Ao todo, teriam sido devastados 28 hectares para plantar cana-de-açúcar em área de preservação permanente na Unidade de Conservação Federal Reserva Extrativista, no município de Jequiá da Praia, a 61 quilômetros de Maceió.
Inicialmente Lyra e os outros réus foram absolvidos, mas o MPF recorreu, de acordo com a assessoria de imprensa do órgão. Em 2021, o processo retornou à primeira instância para análise das provas. O MPF reiterou o pedido de condenação de todos eles e o processo está em andamento.
A usina Caeté faz parte do Grupo Carlos Lyra, que até 2012 incluía também as usinas de Minas Gerais.
Depois de uma cisão naquele ano, as usinas de Alagoas continuaram como parte do grupo, e Lyra ficou com as do Sudeste, dando origem a uma nova empresa, a Delta Sucroenergia.
Segundo a revista Forbes, 11 anos após seu surgimento, a Delta figura entre as 100 maiores do agronegócio brasileiro.
Com a produção de açúcar para exportação e para o mercado interno, além de etanol e bioenergia, a empresa tem uma receita anual de R$ 2,14 bilhões. Em 2022, a Federação das Indústrias de Minas Gerais elegeu Lyra o industrial do ano.
Além dos deputados Zé Vitor e Pinheirinho, Lyra também ajudou financeiramente a campanha de Jair Bolsonaro em 2022, com uma doação de R$ 300 mil, e de mais sete deputados mineiros que não estão na Comissão de Saúde.
O empresário ocupa o 22º lugar no ranking de doadores, com mais de R$ 1,8 milhão desembolsados.
O segundo maior doador para campanhas de deputados que agora ocupam a Comissão de Saúde foi Renato Romeu Sorgatto, produtor de tomate e dono de uma fábrica de processamento que fornece polpa para o mercado de molhos, ketchup e pratos congelados. Ele desembolsou R$ 320 mil para Célio Silveira, do MDB de Goiás.
A quantia representa mais da metade de todas as doações de pessoas físicas e deixa o deputado em segundo lugar entre os membros que mais receberam financiamento do agronegócio, atrás apenas do presidente da comissão, Zé Vitor, que recebeu mais de R$ 900 mil.
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